sábado, 26 de abril de 2014

Debate sobre O Estado de Natureza com o filme The Philosophers 2013

Em complemento ao post anterior, que pode ser acessado pelo link abaixo, segue o rascunho que meu parceiro Rafael Corrêa e eu utilizamos para um debate sobre o estado de natureza, para a mesma disciplina de Filosofia Política.

Utilizamos o filme The Philosophers, do diretor John Huddles, para auxiliar o debate, uma vez que o filme possui aspectos que podem ser correlacionados com conceitos dos autores citados no livro Introdução à Filosofia Política, de Jonathan Wolff, acerca do estado de natureza.






Sobre o filme:
Título original: The Philosophers
Título nos EUA: After the dark
Nacionalidade: EUA, Indonésia
Ano de lançamento: 2013
Direção: John Huddles

Por que escolhemos o filme “The Philosophers”?

São quatro as razões principais pelas quais escolhemos o filme “The Philosophers”: 1-) O filme é atual. 2-) Trata-se de um exercício filosófico em relação à uma hipótese, assim como as hipóteses de estado de natureza em Hobbes, Locke, Rousseau e entre os Anarquistas. 3-) Refere-se a uma situação catastrófica onde as pessoas precisam usar da razão para se auto preservar. Por fim, quarta razão: o filme possui aspectos que podem ser associados às concepções de estado de natureza dos autores citados e que nos permitirá uma reflexão sobre se alguma vez já existiu um estado de natureza ou, se sim, se o mesmo se assemelha com as o estado de natureza dos autores.

Prelúdio

A aula de filosofia acontece em um colégio internacional em Jakarta, capital da Indonésia.
Antes de o professor Zimit propor o exercício do apocalipse para os alunos, os alunos citam algumas das teorias estudadas em classe. Uma das teorias é o paradoxo da ignorância onde é demonstrado que o instinto de autopreservação está acima da amizade e da cooperação, assim como no estado de natureza de Hobbes, onde o objetivo principal é a autopreservação independente dos meios.
Zimit então propõe aos alunos um último exercício: um apocalipse nuclear onde o ele e o grupo de 20 alunos são os únicos sobreviventes, mas apenas 10 deles deverão ocupar um refúgio por um período de 1 ano e serão responsáveis por garantir a sobrevivência da raça humana.

Lógica é a única ferramenta de que os alunos dispõem para selecionarem as pessoas adequadas para ficar no refúgio.

Primeiro Experimento

O primeiro experimento se passa num conjunto de templos Hindu em Prambanan.
O refúgio possui comida e oxigênio suficientes para 10 pessoas durante o período de 1 ano.
O principal critério de seleção das pessoas que ocuparão o refúgio é a profissão de cada um.

Com o mundo prestes a acabar e com recursos escassos, as pessoas manteriam a razão ou a abandonaria, reduzindo-se assim a um suposto estado de natureza? O que vocês acham que uma pessoa faria ao estar próximo do fim? Esperar ou fazer tudo aquilo de que têm vontade?

Logo que o professor propõe o exercício, a garota ruiva diz que não quer participar, pois acha o exercício ridículo e inadequado. O professor a convence a participar utilizando do medo, pois o refúgio seria a única esperança para que não fosse queimada viva e lentamente pela fumaça tóxica dos ataques nucleares. Hobbes cita algo parecido em seu suposto estado de natureza. O pensador diz que num grupo onde todos ou a maioria age de uma determinada maneira, seja boa ou ruim, a pessoa que decide por agir contra tem maiores chances de ser destruída pelo grupo. Em outras palavras, a pessoa precisa agir de maneira semelhante para se auto preservar (WOLFF, 2011, p. 31).

Locke nos diz que, as pessoas estão na terra para servir a Deus, portanto, cooperam entre si, uma vez que não precisam fazer perdurar os desejos uns dos outros (WOLFF, 2011, p. 34). No filme, Zimit, manipula a atribuição de papéis para o experimento como se fosse um deus, de maneira que alguns alunos desempenhem os papéis que ele desejara.

Qual seria a relação entre o que Locke disse com a perspectiva capitalista num mercado de trabalho competitivo como o atual? – Ora, algumas pessoas, por vezes, são obrigadas a desempenharem funções impostas por outra pessoa que está acima. Locke diz que não há superiores na terra, mas alguns superiores não brincam de deus?

Ainda na questão dos papéis, alguns pensadores anarquistas, defendem a importância das especialidades num estado de natureza (WOLFF, 2011, p. 52) que, para eles, estaria além da sociedade civil.

Com base nessa afirmação e considerando que o contexto de mercado atual da sociedade civil contribui para a formação de especialistas, estaríamos próximo do estado de natureza proposto pelos anarquistas?

Quando o poeta se manifesta, Zimit rapidamente lhe dá um tiro na cabeça com a justificativa de que não teria utilidade nenhuma no grupo. Na perspectiva de Hobbes, o professor estaria apenas garantindo a preservação do grupo e, consequentemente, a preservação da própria vida. Os demais alunos ficam desconfiados e decidem por excluir o professor do refúgio. O medo faz com que entrem em estado de alerta ou, na pior das hipóteses, guerra (WOLFF, 2011, p. 25). No entanto, se num estado de natureza o objetivo maior é a autopreservação, as pessoas não poderiam optar por se sujeitarem a fim de preservar suas vidas?

Petra todas as noites observava o professor definhar do lado de fora do refúgio, pois sentia compaixão e aversão pelo sofrimento de Zimit. Compaixão e aversão ao sofrimento alheio são duas características que as pessoas no estado de natureza de Rousseau possuem (WOLFF, 2011, p. 42-43).

De acordo com Rousseau, o ser humano é bom por natureza, mas a sociedade o corrompe.  

Com base nisso, seria correto afirmar que Petra vivia um estado de natureza, ao passo que todos os demais estariam corrompidos? Se há pessoas corrompidas e pessoas boas convivendo, seria correto afirmar que a sociedade civil e o estado de natureza são como uma única coisa?
 
A escassez de bens e o instinto de autopreservação conduzem à guerra?

De acordo com Hobbes e Locke, a escassez de recursos é um dos maiores motivos de disputa entre as pessoas (WOLFF, 2011, p. 23; p. 41), porém, o filme nos mostra o contrário, o professor matou muitas pessoas quando ainda havia comida e oxigênio o bastante, mas os que ficaram no refúgio compartilharam o último recipiente de comida sem que houvesse disputa entre eles. Nesse ponto, a escassez dos recursos e o instinto de autopreservação já não seriam certos de que levariam à guerra. O filme ainda nos mostra a possibilidade do suicídio coletivo que é desconsiderado no livro do WOLFF por todos os autores.

Segundo Experimento

O segundo experimento se passa no Monte Bromo.
Há alguns critérios adicionais para seleção como homossexualidade, esterilidade e doenças.
Dentre os novos critérios de seleção, o pior é doença, pois se contagiosa poderia infectar outros e como estariam presos todos juntos, morreriam prematuramente. Diante disto, a atitude mais lógica seria excluir o doente, assim como é feito na sociedade atual. Em relação à homossexualidade, esta não seria descartável contanto que a pessoa fosse fértil e capaz de reproduzir. No entanto, seria sensato reproduzir num ambiente de escassez de bens? Essa lógica se aplica a um estado de natureza onde não há moralidade? O fato de não ter moralidade implica em não ter razão? – Se num estado de natureza há escassez de bens e, por conclusões da razão, não há reprodução, as pessoas não têm muitas opções senão a extinção da raça humana, a menos que por sorte se reduzam até um novo Adão e Eva.

Na segunda experiência há também uma divisão de grupos por interesses em comum. Essa divisão pode existir tanto na sociedade civil quanto num suposto estado de natureza. Se considerarmos o que Hobbes diz sobre respeitar as leis da natureza somente com a certeza de que todos estão respeitando (WOLFF, 2011, p.31), seria duas vezes mais difícil manter a paz entre grupos distintos.

Rousseau contrapõe Hobbes ao dizer que as sociedades surgem conforme o ser humano se aperfeiçoa até o ponto em que os corrompe (WOLFF, 2011, p. 47-50). Hobbes, todavia, diz que, as pessoas corrompidas poderiam entrar em guerra por desejarem a mesma coisa até se reduzirem a um estado de natureza (WOLFF, 2011, p. 23-24). Além disto, Rousseau diz que Hobbes ignora a compaixão natural do ser humano (WOLFEE, 2011, p. 42-43), no entanto, Rousseau ignora o egoísmo que em Hobbes também é natural (WOLFF, 2011, p. 25). Diante disto, é o estado de natureza que leva à civilização ou o mesmo nasce da civilização?

Há uma briga interna pelo poder de decisão quanto à questão de reprodução. O professor fica gravemente ferido e, por isso, resolve abrir o refúgio e deixar que todos sejam consumidos pelas chamas do apocalipse. Essa passagem faz referência ao direito de punição em Locke (WOLFF, 2011, p. 37) e a contraposição de Hobbes de que o transgressor poderia se vingar (WOLFF, 2011, p. 39).

Terceira rodada

Na terceira rodada é a Petra quem conduz o jogo. Ela sugere ao grupo lidera-los e o grupo aceita a sugestão. Petra toma as decisões de quem deveria ocupar o refúgio com base na emoção e todas as habilidades descartadas na primeira rodada são consideradas ideais para ela.

O garoto ruivo e estéril decide por partir para outra ilha deserta com várias mulheres para poder satisfazer o desejo sexual.

Petra e o grupo decidem por aceitar a morte quando a mesma é eminente.

Nessa rodada, há um aspecto que faz referência ao contratualismo de Hobbes, na definição de uma pessoa soberana, assim como aspectos que fazem referência à boa natureza de Rousseau.
 


Referência bibliográfica

WOLFF, Jonathan – Introdução à filosofia política, 2º Edição, 2011, Ed. Gradiva, Lisboa

Imagem disponível em:  http://movit.net/wp-content/uploads/2013/05/Bonnie-Wright-James-DArcy-and-Daryl-Sabara-in-The-Philosophers-Movit.net_.jpg, acessado em: 26/04/2014

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