sexta-feira, 17 de junho de 2011

O Míto de Sísifo

Olá, pessoal!

Hoje iremos estudar o mito de Sísifo, interpretado pelo filosófo e escritor francês, Albert Camus.

Camus utiliza o mito de Sísifo para introduzir e sustentar o seu ensaio filosófico sobre o absurdo e o suicídio.

Porém, antes de começarmos, gostaria de agradecer imensamente minha companheira de trabalho, Andrea Mascarello, pois teve muita paciência comigo ao longo dessa pesquisa até que, por fim, entramos num acordo!

Espero que gostem da postagem e não pensem em se matar!

Abraços


O Mito de Sísifo


Sísifo, mítico fundador de Éfira, nome antigo da cidade de Corinto, é citado na Ilíada de Homero como sendo filho de Éolo, o rei de Corinto. É considerado o mais astuto e audacioso dos mortais, o único mortal a se casar com uma das Plêiades, Mérope, e ser aparentemente um dos primeiros gregos a dominar a escrita.

Algumas versões relatam que certa vez, o mais esperto e bem-sucedido ladrão da Grécia, Autólico, filho de Hermes e vizinho de Sísifo, tentou lhe roubar o gado. Os animais desapareciam gradualmente sem o menor vestígio do ladrão. Mas Sísifo ficou desconfiado, pois à medida que seu rebanho ia diminuindo o de Autólico só aumentava. Astuto como era Sísifo, começou a marcar os cascos de seus animais com um sinal, que, conforme se movimentavam, descrevia: “Autólico me roubou”. Ao fim deste episódio ambos ficaram amigos e Sísifo teria desposado a filha de Autólico, Anticléia, de onde nasceu Odisseu, um dos principais heróis do Ciclo Troiano. A lenda conta ainda, que, devido à sua paixão pela vida e rebeldia contra os deuses, Sísifo conseguiu enganar a morte duas vezes.

Sísifo viu acidentalmente Zeus raptar Egina, filha do Rio Asopo, e assim rapidamente delatou o fato ao pai dela em troca de uma nascente que o deus-rio fez brotar em Corinto. Zeus, furioso com Sísifo por ter revelado seu segredo, imediatamente enviou-lhe Tânatos, a morte. Mas, segundo Homero, Sísifo foi tão esperto que acabou encontrando uma maneira de aprisioná-la. Quis enfeitar o pescoço de Tânatos com um colar, mas que na verdade era uma coleira. Hades, ao ver seu reino empobrecido e silencioso, foi queixar-se para Zeus, que, interveio e libertou Tânatos, cuja primeira vítima seria Sísifo. 

“Contam também que Sísifo, já perto de morrer, quis imprudentemente pôr à prova o amor de sua esposa. Ordenou que ela jogasse seu corpo insepulto no meio da praça pública” (CAMUS, 2010, p.138). Ao chegar ao Hades sem as devidas honras fúnebres, o astuto Sísifo “mentirosamente culpou a esposa de impiedade e, à força de súplicas, conseguiu permissão para voltar rapidamente à terra, a fim de castigar sua companheira” (BRANDÃO, 1988, p.226).

Quando Sísifo retornou à terra, retomou seu corpo e fugiu com sua esposa enganando a morte pela segunda vez. Viveu por muitos anos até que um dia, Tânatos veio buscá-lo por definitivo. Sísifo foi condenado a empurrar eternamente uma rocha montanha acima, que, ao chegar ao topo, rolava para baixo devido ao seu próprio peso, sendo obrigado a recomeçar sua tarefa. Tal tarefa contínua e eterna fazia com que Sísifo não tivesse tempo pata descansar ou pensar em fugas. 


Mitologia

A interpretação do mito de Sísifo que Camus, filósofo e escritor francês propõe em sua obra “Le Mythe de Sisyphe”, publicada em 1942, nos permite aproximar Sísifo da vida atual e cotidiana. É através dela que Camus apresenta seu ensaio filosófico sobre o homem absurdo e o suicídio, portanto, o mito de Sísifo trata-se de uma questão existencialista.

Camus descreve o homem como homem absurdo, devido ao fato de que, ciente de sua condição e independente de suas ações, fatores sociais, étnicos, religiosos ou econômicos, terá apenas um único destino imutável, a morte.

Enquanto muitas pessoas abjuram de suas crenças para viver a vida em harmonia com a sociedade e aproveitando ao máximo, outras simplesmente encerram a própria vida por concluírem que ela não vale a pena ser vivida, pois o ser humano desde o seu nascimento está condenado a morrer e não há nada que se possa fazer para mudar isso. Camus, com base nesse raciocínio, levanta a questão sobre o que estimula o ser humano a encarar essa realidade, executar sempre as mesmas rotinas e não recorrer ao suicídio.

Segundo Camus, “só existe um problema filosófico realmente sério: o suicídio. Julgar se a vida vale ou não vale a pena ser vivida...” (CAMUS, 2010, p.17).

Camus aborda o suicídio como sendo uma reação contra o sentimento de absurdo. “Matar-se, em certo sentido, é como no melodrama, é confessar. Confessar que fomos superados pela vida ou que não a entendemos” (CAMUS, 2010, p.19).

Reconhecer que a morte é inevitável, que os gestos desempenhados ao longo da existência são ridículos e inúteis, é tomar consciência do quanto a vida é absurda. Esta consciência é ao mesmo tempo um profundo motivo para encurtar a existência.

Várias podem ser as razões que nos fazem viver: a nossa família, o amor a uma determinada pessoa, nosso amor próprio, mas vivemos sempre buscando uma razão em especial para justificar a nossa existência.

Camus dá uma atenção especial para a questão da religiosidade. Muitas pessoas se apegam a fatores religiosos para justificar ou acalmar certos anseios, certos questionamentos sobre vida. O religioso acredita muitas vezes que devemos viver intensamente e de maneira correta, pois algo maior e melhor nos espera após a nossa morte. O ser humano deve carregar sua pedra todos os dias, cultivar bons hábitos e praticar boas ações, assim, será presenteado com um lugar no paraíso ou um lugar no céu. Essa fé em algo que é superior a existência humana, superior a realidade, é o que move as pessoas religiosas a empurrar a sua pedra todos os dias, explica Camus.

De acordo com Camus, o Sísifo que é narrado não é tão diferente do homem atual e, por isso, pode-se fazer uma analogia entre seu mito e a vida cotidiana.

Cenários desabarem é coisa que acontece. Acordar, bonde, quatro horas no escritório ou na fábrica, almoço, bonde, quatro horas de trabalho, jantar, sono e segunda terça quarta quinta e sexta e sábado no mesmo ritmo, um percurso que transcorre sem problemas a maior parte do tempo. Um belo dia, surge o “por quê” e tudo começa a entrar numa lassidão tingida de assombro. “Começa”, isto é importante. A lassidão está ao final dos atos de uma vida maquinal, mas inaugura ao mesmo tempo um movimento da consciência (CAMUS, 2010, p.27)

Se dermos crédito a Camus, quando Sísifo foi condenado a rolar eternamente sua rocha até o cimo de uma montanha, os deuses haviam chegado à conclusão de que não existe castigo pior do que o trabalho inútil e sem esperança. No entanto, Sísifo é um apaixonado pela vida e está disposto a seguir adiante.

A rocha que Sísifo carrega pode ser compreendida como o fardo da morte ou condição imutável da vida, assim como, uma esperança ou algo que dê sentido à existência. O castigo de Sísifo é ao mesmo tempo seu estímulo para seguir adiante.

Camus explica que, enquanto Sísifo desce a montanha para recomeçar sua tarefa, ele respira e se torna consciente de sua situação. Mas é durante esse percurso que Sísifo desafia os deuses e se torna maior do que seu próprio destino. O homem atual realiza uma série de tarefas inúteis e sem esperança, sendo obrigado a se tornar criativo em sua repetição. Por muitas vezes, o homem absurdo reclama de sua condição e do quanto pesado é seu fardo, porém, são essas mesmas tarefas que dão algum sentido em sua existência – um propósito de viver mesmo sabendo que seu destino é a morte certa.

Deixo Sísifo na base da montanha! As pessoas sempre reencontram seu fardo. Mas Sísifo ensina a fidelidade superior que nega os deuses e ergue as rochas. Também ele acha que está bem. Esse universo, doravante sem dono, não lhe parece estéril nem fútil. Cada grão dessa pedra, cada fragmento mineral dessa montanha cheia de noite forma por si só um mundo. A própria luta para chegar ao cume basta para encher o coração de um homem. É preciso imaginar Sísifo feliz (CAMUS, 2010, p.141).

Genealogia


A genealogia de Sísifo é mencionada na Ilíada (Il. 6.152-5) e o seu castigo é descrito na Odisséia (Od. 11.593-600).


Literaturas sobre Sísifo

O diálogo filosófico Sísifo, durante muito tempo atribuído a Platão, nada tem a ver com o Sísifo lendário, apesar do título. No século V a.C., Ésquilo, Sófocles, Eurípides e Crítias escreveram tragédias baseados no mito de Sísifo, mas nenhum deles chegou até nós, da mesma forma que as comédias dos poucos conhecidos Apolodoro, poeta grego, (séc. IV/III a.C.) e de Lucius Pomponius, poeta romano (fl.c. -90).

Entre as obras modernas podemos citar Sisyphus: Na Operatic Fable, de Robert Trevelyan (1908) e outros vários poemas curtos, entre eles o de A.Rabbe (1924), Robert Garioch (1971?), Miguel Torga (1978), U.A. Fanthorpe (1982), Gary J. Whitehead (1997) e Stephen Dunn (2003). Mas a obra mais célebre e conhecida sobre o mito de Sísifo é o ensaio filosófico de Albert Camus, Le Mythe de Sisyphe (1942) (PORTAL GRÉCIA ANTIGA, 2008).


Sobre Albert Camus

Nasceu na Argélia, em 7 de novembro de 1913 e teve uma infância miserável devido a 1ª Guerra Mundial;

Escreveu “Le Mythe de Sisyphe” (O Mito de Sísifo – ensaio sobre o absurdo) em 1942, aos 29 anos de idade, sua obra mais ideológica. É considerado um filósofo existencialista;

Em 1957 é concedido à ele o Prêmio Nobel devido às suas obras;

Morre ao 46 anos em um trágico (e absurdo) acidente de carro, na França, em 4 de janeiro de 1960. Ele deixou de tomar um trem para Paris, sendo que já estava com a passagem comprada, para pegar carona com o editor de um de seus livros. Camus morre com o bilhete do trem no bolso.


Fontes de Pesquisa

PORTAL GRÉCIA ANTIGASísifo - Disponível em:

BRANDÃO, JUANITO DE SOUZA - Mitologia Grega Volume I, Petrópolis, ed. Vozes, 1986.

CAMUS, ALBERT - O Mito de Sísifo, Trad. Ari Roitman e Paulina Watch, 8ª ediçao, Rio de Janeiro, ed. Record, 2010.

HOMERO, Íliada – Trad. Manoel Odorico Mendes, disponibilizado na web pelo grupo Quatro Contra Tróia em: www.iliadadeodorico.wordpress.com, 2009.

HOMERO, Odisséia – Trad. Antônio Pinto de Carvalho, São Paulo, ed. Abril, 1981.