sexta-feira, 6 de julho de 2012

Devaneio: Tudo é música: uma analogia sobre uma citação de Cassirer



[...] Muito antes de aprender a falar, a criança já descobriu outros meios mais simples de se comunicar com as pessoas. Os gritos de desconforto, dor e fome, medo e susto que encontramos em todo o mundo orgânico começam a assumir uma nova forma. Deixam de ser reações instintivas simples, pois são empregados de maneira mais consciente e deliberada. Quando é deixada sozinha, a criança exige por sons mais ou menos articulados a presença da babá ou da mãe, e percebe que essas exigências surtem o efeito desejado. O homem primitivo transfere essa primeira experiência social elementar para a totalidade da natureza. Para ele, natureza e sociedade não estão apenas interligadas pelos mais fortes vínculos; formam um todo coerente e uma grande sociedade – a sociedade da vida. A partir desse ponto de vista, podemos entender facilmente o uso e a função específica da palavra mágica. A crença na magia está baseada em uma profunda convicção da solidariedade da vida. Para a mente primitiva o poder social da palavra, experimentado em inúmeras ocasiões, torna-se uma força natural, e até sobrenatural. O homem primitivo sente-se rodeado por todo tipo de perigos visíveis e invisíveis. Não pode ter esperanças de superar esses perigos por meios meramente físicos. Para ele, o mundo não é uma coisa morta ou muda; ele pode ouvir e entender. Logo, se os poderes da natureza forem convocados da maneira correta, não poderão negar-se a ajudar.

Li o texto “A Linguagem” do Cassirer inteiro por pelo menos umas três vezes e conclui que, todos os trechos descritos permitem uma reflexão profunda. Por esta razão, escolhi o trecho acima que é o primeiro dos trechos e que nos permite refletir sobre a origem da linguagem e o seu impacto no mundo e nos seres vivos.

De acordo com Cassirer, uma criança antes de aprender a falar já descobriu outras maneiras conscientes de se comunicar com o mundo. A criança emite sons articulados e determinados objetos e pessoas e, já é o suficiente para conseguir o que deseja. Isto me faz pensar que a linguagem por si só não é uma criação humana, mas uma característica do próprio ser humano, uma condição necessária para que a espécie entre em harmonia com a natureza e interaja com outros seres vivos.

Com base nessa afirmação, fiz uma analogia entre a linguagem humana com a linguagem musical, uma vez que a música é tão antiga que ninguém ao certo sabe sua origem, mas que provavelmente existe desde a origem do mundo. Fiz também uma analogia entre o poder da linguagem e a fé de que Jesus dispunha e falava.

Até então, a mistura de sons, silêncio e gestos, como um maestro regendo uma grande sinfonia, era o suficiente para fazer as coisas acontecerem. Neste contexto, essa grande sinfonia operava milagres, era a própria voz de Deus. Porém, num determinado momento, o ritmo dessa sinfonia vibrou de tal maneira que causou uma reação num indivíduo qualquer e este decidiu por tentar colocar esse ritmo no papel.

Quando essa sinfonia foi escrita, o seu ritmo foi classificado de uma maneira não muito efetiva, ou seja, incapaz de representar as propriedades do som. Consequentemente, as vibrações foram deixadas de lado e os milagres foram deixando de acontecer, ao passo que, a insatisfação do homem e angústia ia aumentando e gerando novos estilos musicais.

Essa variedade de estilos musicais dividiu os seres humanos, que passaram a tocar seus ritmos simultaneamente a fim de demonstrar qual era o mais intenso e que predominaria sobre os demais ritmos. Neste exato momento houve uma divisão entre o ritmo bom e o ritmo ruim, vibrações que geravam o bem e vibrações que geravam o mal. Acabou-se o milagre da música e também a fé que as pessoas inconscientemente depositavam nela.

Os maestros que regiam essa variedade de músicas dos mais diversos estilos romperam sua ligação com a natureza que, em determinado momento, clamou por salvação. Então, o verbo se fez carne (João 1:14), - a 9ª sinfonia de Beethoven - que ao ser reproduzido curava e trazia de volta a vida.

Jesus veio como o novo maestro capaz de restabelecer a ligação dos demais com o mundo a fim de que todos voltassem a fazer parte da mesma orquestra. A música que Jesus produzia era muito poderosa e a convicção e ele tinha nela era maior do que qualquer coisa. As vibrações de sua música eram a fonte de toda a vida, pois estava em harmonia com o mundo. Porém, como as pessoas já haviam se corrompido e optado por estilos musicais contrários ao estilo original, o negaram. Percebemos hoje a quantidade de pessoas que dizem não gostar de música clássica ou que gostam, mas não estudam ou praticam.

No princípio tudo era música, porém, desde que foi estabelecida uma escrita, a essência se perdeu e palavra nenhuma foi capaz de resgatar o seu real significado. Os sons que não se enquadram nas sete notas da escala musical, são menosprezados como se a música não precisasse mais deles.

Desaprendemos como ouvir e somente quando resgatarmos essa habilidade, nossa alma será capaz de cantar livremente e então estaremos à imagem e semelhança de Deus.

Fonte da imagem: http://baladementacomchocolate.zip.net/images/cadeira.jpg - Acesso em: 06/07/2012